29 de outubro de 2014
Uuuuuuuuuuuu!
Se tivéssemos nos encontrado no elevador, em um dia qualquer, eu, acompanhada de três crianças, ela, a senhora elegante de cabelos brancos arroxeados, teríamos trocado um boa tarde e possivelmente esboçado um dialogo sobre como essa umidade do Recife não é boa para maquiagem. Se houvéssemos nos esbarrado num ônibus, apesar de achar improvável ela andar de ônibus, teria cedido meu lugar. Se o embate fosse numa fila de banco, haveria pensado secretamente “lá vem outra preferencial, me lasquei, vou me atrasar pro médico”.
Mas nosso primeiro e derradeiro encontro se deu, não num dia qualquer, mas em um domingo de eleição. Ela, do cordão azul, vestida a caráter e sentada na varanda do restaurante. Eu, do time encarnado, andando pela calçada, carregando as já mencionadas três crianças. Não teria percebido a elegante (sobre elegância discutiremos mais profundamente nos próximos parágrafos) senhora de cabelo branco arroxeado, não fosse pela vaia. Sim, eu disse vaia.
Quase não entendi, pela falta de costume de ouvir um Uuuuuuu, porque, né, a última vez que fui vaiada foi na final de volley da sexta A contra a sexta B, quando eu perdi o saque que poderia salvar o time da derrota nas olimpíadas escolares. Perdemos, mas não sem antes a turma ser repreendida pelo treinador porque o que vale nessa vida é competir, dizem. A senhora de cabelo arroxeado, não mais tão elegante assim, parece não concordar e estava em pé me vaiando.
Edu não entendeu, Luca franziu a testa e Maria disse “você está louca, querida”.
É isso, vai que ela é a louca da vaia! Deve ter vaiado a enfermeira que ajudou no banho ontem e vaiou o homem da macaxeira, só porque ele passou do lado errado da calçada. Acho que vaiou o porteiro que disse bom dia quando, na real, já era boa tarde e vaia Faustão sempre que ele diz “ô louco, meu”.
Mas a verdade é que, uuuuuuuuuuu, todas as pessoas do restaurante, pelo menos todas as que estavam de azul, vaiaram junto com ela. Aí incluídas as duas netas da, cada parágrafo menos elegante senhora, que a partir daquele domingo aprenderam que é correto vaiar quando não se concorda com alguém. Para fins de contextualização, e não de vitimização, nosso crime foi passar pela calçada usando a cor errada.
Opções de reação:
A – Téta Barbosa saiu da conversa, se fosse no facebook.
B – “ Vai ficar frescando, é?” , com a mão devidamente colocada na cintura e o olhar meigo da noiva de Chuck.
Mas a cena perdeu o potencial cômico quando a senhorinha disse, com sua voz cheia de ternura: “ bando de comunista que só espalha merda”.
Atravessei a rua, me sentindo a emparedada da 17 de Agosto, num fim de tarde ameno com sensação térmica de #CalaBocaGalvão.
E essa foi a pior derrota que me ocorreu, desde a batalha contra a sexta A. Foi ali que percebi que perdemos para o pior adversário, desde a Alemanha: nós mesmos. Brasil contra brasileiros em uma disputa desonesta e vergonhosa. Depois que, enfim, o Acre teve seus 15 minutos de fama e ficamos sabendo o resultado das eleições, me deparei com duas perguntas:
1 – O Acre ainda existe?
2 – O que comemorar em um país onde sua opinião não é respeitada, a Veja enlouqueceu, Collor foi eleito, Bolsonaro reeleito e vovozinhas de cabelo roxo sobem na mesa pra vaiar?
#VaiTerDilma, e se vaiar, vai ter duas!