Sim, além de bolsas, roupas, sapatos, uma cidade também pode ser marca.
Não é fácil virar marca. Tem que ser de dentro pra fora. Primeiro o povo da cidade tem que acreditar que o lugar é o melhor do mundo, tipo aquele regionalismo/bairrismo de dar raiva. Depois, só depois, o resto do mundo vai acreditar também.
Quando uma cidade vira marca, ela tem produtos. Esses produtos por sua vez, não vendem uma praia paradisíaca, nem hoteis fantásticos, nem passeios de buggi, nem ruas modernas, nem museus….eles vendem um ESTILO DE VIDA. Tipo, quero ser carioca quando crescer, sabe?
Uma das cidades que faz isso super bem é Salvador! Provavelmente esse bairrismo arraigado estilo “baiano não nasce, baiano estréia” deve ter surgido com ACM (em práticas moralmente/politicamente duvidosas) mas, não importa. O importante é que o povo acreditou e transformou Savador em referência de música (por pior, na minha opinião, que ela seja), gastronomia, cultura, show. E por aí vai. A fitinha do Nosso Senhor do Bonfim é conhecida nacionalmente (se brincar, até internacionalmente) e já virou todo tipo de produto que se possa imaginar.
Agora eu pergunto: quando uma pessoa compra uma bolsa com estampa de fitinha, está comprando só uma bolsa? NÃO, está comprando o espírito baiano de ser.
Nova York não tem praias pra oferecer, nem sol o ano inteiro. Mas o mundo TODO quer ir pra lá. Você poderia querer ir para Sidney, ou Berlim, ou Praga mas você quer mesmo ir pra NEW YORK. Por que? Porque algum engraçadinho disse I LOVE NEW YORK e pronto. O mundo todo passou a amar, sem nunca ter ido. A t-shirt com a declaração de amor a cidade deve ser o CASE de publicidade de maior sucesso do mundo. Acho que nem a camiseta com a clássica foto de Che Guevara vende tanto. A marca nem é bonita, vamos combinar! Mas, mais uma vez, ela vende um estilo cosmopolita de vida. Você dizer/usar I LOVE NOVA YORK quer dizer que você é moderno, antenado, descolado, globalizado. E numa hora dessas, quem quer saber se lá faz um frio dos infernos? A gente quer mais é ir pra lá e tirar foto pra colocar no Facebook e todo mundo ver! Vai dizer que não?
Tem coisa que dá mais raiva nesse mundo do que você entrar na FARM pra fazer umas comprinhas e encontrar aquela etiqueta (naquele vestido que você AMOU) dizendo: RIO R$90,00 , Resto do Brasil R$ 179,90. P….Que o P…, dá vontade de fingir um sotaque carioca e jurar que nasceu na Barra só pra comprar pelo preço carioca de ser!
Mas carioca é assim, ama ser carioca. Ama o sotaque carioca. Ama o sol carioca. E ama, principalmente, vender tudo isso para o mundo. Já viu algum gringo dizer que é louco pra conhecer o Piauí? Ou Maceió? Ou Campo Grande (que nem você que está lendo esse post/desabafo quer ir). Não. O mundo quer ir pro Rio. O mundo quer ser bronzeado e ter aquela cor que só o carioca tem. O Rio virou filme, música, roupa, livro. O Rio virou ideal de vida! Se você comprar uma canga de praia com a estampa do calçadão de Copacabana, você está dizendo “O Rio é o MÁXIMO”, certo?
Agora, porque danado NADA disso acontece no Recife?
Chegamos perto, é verdade. Na era Chico Science (diga-se de passagem, o único que conseguiu elevar nossa auto-estima) era cool ser do Recife. De repente, de uma hora pra outra, a cidade virou referência de música, moda, arte, novidade (principalmente novidade). Ser da Mangue Town era o MUST. Era massa. Aí, ele morreu. Pronto, a gente voltou a reclamar do calor (do qual metade do universo tem inveja), do cheiro do mangue, da falta de eventos, do tamanho da cidade. Nem ouvir Roger dizer que “Recife é a maior menor cidade do mundo” fez a gente se animar.
Sempre que penso no Recife (“cidade pequena, porém decente” como dizia meu avô), lembro de Adriana Falcão. Carioca que morou MUITOS anos por aqui, ela escreveu o livro A MÁQUINA. Nele ela descreve uma cidade chamada NORDESTINA e eu não tenho dúvida NENHUMA que ela se inspirou em Recife ao escrever:
“Naquele tempo Nordestina era uma cidadezinha desse tamanhinho assim, da qual se dizia, eita lugarzinho sem futuro. Antônio ouviu dizer isso desde pequeno e deu por certo o fato. Pra chegar a Nordestina tinha que se andar bem muito. É claro que ninguém fazia isso. O que é que uma pessoa is fazer num lugar que não tinha nada pra fazer? …..Entre Nordestina e a cidade que ficava antes dela tinha uma placa com os dizeres BEM-VINDO A NORDESTINA. Há quem diga que até o tempo de Antônio quase ninguém tomou conhecimento da existência dessa placa. O povo que morava da placa pra dentro imaginava uma risca no chão que separava Nordestina do resto do mundo. O povo que morava da placa pra fora não imaginava nada, jamais pensou no assunto e não tinha a menor ideia de que pra lá dali ainda tinha mais um pouco! “
Bom, se Recife não parece Nordestina, vai parecer já, já. Isso se a gente não tomar nenhuma providência. Enquanto o povo que mora aqui tiver como ideal de vida ir morar em São Paulo…(estilo retirante da seca) , estaremos numa cidadezinha do lado de cá da risca. Porém, no entanto, todavia, a gente sabe que nossa mangue town em NADA se parece com Nordestina. Aqui é massa. Mas será que o povo daqui já sabe disso?
Proponho: vamos transformar RECIFE em marca JÀ.
Publicitários, designers, estilistas, artistas, jornalista, UNI-VOS!
Vamos pensar num símbolo que represente Recife. Uma frase. Um desenho. Um estilo de vida. Porque, senhoras e senhores, daqui eu não saio nem a pau! E, quem quiser, que vá passar frio e respirar poluição em São Paulo.