Carta ao Ilmo. Sr. Inverno.

Caro Sr. Inverno,

Venho através desta, reivindicar nosso direito a um inverno razoavelmente digno. Coisa simples, que meia dúzia de nuvens resolveria.

Imagino que o Sr. tenha ficado preso no trânsito para justificar esse atraso. Já estamos nos finalmentes de Maio, mas o calor é de Janeiro e a seca a maior dos últimos 45 anos.

Não me venha com essa conversa mole de efeito estufa causado por um punhado de garrafas pet ou problemas na camada de ozônio. Por aqui estamos ocupados com os trombadinhas da Agamenon, o preço da passagem de ônibus e o trânsito que não anda. Então resolva seus probleminhas domésticos por aí enquanto a gente resolve os nossos aqui.

Por falar em efeito estufa (carinhosamente apelidado no Recife de efeito cuscuzeira), uma boa solução seria derreter logo essas tais calotas polares e mandar a água que sobrar lá nos pólos, que pelos meus cálculos deve ser muita, pra cá. Mesmo ainda relacionando calotas com as rodas dos carros (por freqüentar mais oficina do que ambientes científicos), a transposição desse gelinho derretido deve ser mais fácil que a transposição do São Francisco que, diga-se de passagem, está difícil de acabar. Com projeto pensado desde a época de Dom Pedro II, com discussão retomada em 1943 por Getúlio Vargas e em andamento desde 2004 (com obras iniciadas em 2007), imagino que os trabalhos dessa transposição sejam como Olimpíadas, só acontecem a cada quatro anos. Não sei o que rola entre uma olimpíada e outra, o fato é que o negócio num anda. Então, vamos apressar esse derretimento das calotas (de gelo e não dos carros), senão a gente vai começar a tomar banho com água do mar (se ele também não evaporar).

Precisamos do inverno e precisamos com urgência. Alguns motivos me levam a fazer esse apelo:

Motivos fúteis: o calor derrete a maquiagem, deixa o cabelo oleoso e não permite a gente usar botas nem as tendências de inverno que o resto do mundo usa.

Motivos importantes: o povo do sertão está com sede e fome. O gado está morrendo e mais de 90 municípios de Pernambuco já decretaram estado de emergência.

Enquanto nossos políticos estão ocupados com coisas  “importantes” como eleições internas de partido e sucessão de cargos, contamos com sua ajuda, Sr. Inverno, para soprar uma brisa e trazer umas nuvenzinhas para cá.

Agradeço desde já sua compreensão e atenção. Sem mais, despeço-me com elevada estima e consideração.

Atenciosamente, Téta Barbosa