Apropriação cultural, moda e sincretismo fashion.

Me falta ânimo quando o racismo é combatido com mais racismo, só que ao contrario. Dito isto, acho inválido o argumento, escrito no facebook esta semana, da moça negra quando prega que moças brancas não devem usar turbante porque o mesmo é símbolo da luta negra e não modinha de it girl.

Vou deixar passar minha quase involuntária ironia e nem vou alegar que o turbante, este tão inocente acessório da discórdia, veio mesmo foi do Oriente, antes do Islamismo. Vejam vocês, um simples pedaço de pano, usado na Índia, Paquistão, Afeganistão e no Oriente Médio, no banco dos réus pelo crime de apropriação cultural por parte das brancas.

Seguindo este raciocínio e considerando a hipótese de que o turbante tenha vindo da África, sem escalas, significa que turbante é somente coisa de negro. Indo além, seria então triste e lógico considerar errado negros usarem jeans, já que este tão querido item do armário foi criado por franceses brancos e popularizado por americanos mais brancos ainda, simbolizando a luta e resistência dos mineradores da Califórnia.

Mas, veja bem, em que encruzilhada fashion/cultural nos encontramos em pleno ano de 2015 quando, imaginava eu, já estava mais do que na hora de juntar forças e não separá-las. Porque, no fim do dia, Martin Luther King disse I Have a Dream e não Independência ou Morte. Portanto, acho que agora, uma hora dessas, separar coisa de negro e coisa de branco é o mesmo que fazer um moonwalk na história de luta da união e coexistência da harmonia entre brancos, negros, amarelos, coloridos e os verdes de bolinha azul.

Até entendo essa resposta rancorosa de uma raça negra que sofre, até hoje, da elite brasileira branca um preconceito nojento e disfarçado que finge que a escravidão acabou, mas compra farda para a empregada negra. “Overcome the devils with a thing called love” seria o recado do rastafári, Bob Marley. Abre parênteses; negro usar dreadlocks é estar se apropriando culturalmente dos rastafáris? Branco pode? A Jamaica fica no Caribe, perto de Cuba, mas latinos da America do Sul podem? Fecha parênteses de forma confusa e fragmentada, porque até a gramática não sabe mais se este argumento de apropriação cultural é uma conjunção aditiva ou adversativa.

Tudo isso apenas para dizer que o desfile da Cavalera, neste São Paulo Fashion Week, inspirado no povo indígena da tribo Yawanawá, não só teve roupas lindas, como os índios foram convidados para tocar, ao vivo, a trilha sonora do desfile.

Apropriação cultural, diriam uns, eu vejo como uma homenagem a um povo que deu origem ao nosso. Vejo, sendo quase piegas, que esse tipo de coisa nada mais é do que o branco colocando o rabo entre as pernas e assumindo que um outro povo criou algo mais bonito e criativo do que ele próprio, neste caso, os melhores fashionistas do país. O estilista branco é tão genial que precisa buscar inspiração no costume de um povo que ele mesmo, homem branco, quase destruiu. É ou não é um 7 X 1 , no final da copa do mundo, para os índios? Assim como brancas que usam turbante estão dizendo “ok, você venceu, batata frita” para todas as negras lindas do Brasil.

Nota – sou branca e esta não é uma tentativa fuleira de problematizar meus privilégios. Apenas de aceitá-los e me sentir envergonhada por eles. Que o turbante seja um elo e não uma lacuna.

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